Jovens ainda esperam se aposentar antes dos 60 anos
Pesquisa Datafolha mostra que homens e mais ricos param antes de trabalhar.
Apesar de todo o debate recente sobre a necessidade de adiar a idade de aposentadoria, os brasileiros que têm hoje de 16 a 24 anos esperam se aposentar aos 59,8, na média.
É o que mostra pesquisa Datafolha sobre valores e expectativas das diferentes faixas etárias de brasileiros.
A expectativa dos mais jovens é irrealista, porém, se for adiante a proposta em discussão no Congresso, cuja votação foi agora adiada para o próximo governo.
No texto em discussão, a idade mínima para a aposentadoria será de 62 anos para mulheres e 65 para homens daqui a 20 anos.
Até lá, pode ser ainda mais alta: a proposta de emenda à Constituição prevê que a idade mínima se eleve sempre que a expectativa de sobrevida da população subir um ano, algo que pode ocorrer em cerca de uma década.
Em parte, essa discrepância entre os planos dos jovens e a crise da Previdência se deve à desinformação.
Pesquisa do Ibope feita a pedido do Palácio do Planalto mostrou que, até dezembro do ano passado, 41% da população não tinha conhecimento das mudanças nas regras de aposentadoria, propostas pelo governo no fim de 2016.
Futuro longínquo
E o governo tem responsabilidade nessa ignorância, opina o empresário e publicitário João Roberto (Bob) Vieira da Costa, especialista em comunicação pública.
"No mundo todo, a discussão sobre Previdência é difícil, porque as pessoas estão voltadas para seu dia a dia, os filhos que precisam criar, tarefas a resolver. A perspectiva da aposentadoria está num horizonte muito longínquo para a maioria. E, se está longe, a tendência é simplificar as opiniões: sou contra, pronto."
Vieira da Costa argumenta que, além disso, o tema do debate é incômodo: "Remete ao envelhecimento, algo difícil de trabalhar com o público mais jovem".
A dificuldade na comunicação da reforma previdenciária é ainda maior se o público-alvo forem os que estão mais próximos da aposentadoria: "A pessoa olha para trás e pensa que trabalhou para se dedicar a si mesmo, viajar, cuidar dos netos. Há um conjunto significativo de valores aspiracionais e o espaço para negociá-los praticamente não existe".
Para o publicitário, a mensagem de que existe uma crise nas contas públicas não tem apelo. "Ninguém vai ser solidário com o problema do país, até porque o Estado não dá o básico em saúde, segurança, prestação de serviço."
O adiamento da votação para o próximo governo pode ter ao menos uma vantagem na tarefa de convencimento dos defensores da reforma: há mais chance de ter ficado para trás o clima de polarização política atual.
"Se o debate está muito politizado, não adianta tentar convencer ninguém", afirma Vieira da Costa.
No total da população, os brasileiros que ainda não se aposentaram esperam fazê-lo, na média, com 60,8 anos –no caso dos que têm 60 anos ou mais e ainda trabalham, a média citada é a mais alta, 63,7 anos.
Mais de um terço (36%) dos idosos ainda na ativa diz não ter ideia de quando vai parar, e são 31% os que esperam deixar a ativa antes dos 65 anos.
Desigualdade
Dos brasileiros que já se aposentaram, há uma realidade desigual: homens se aposentam antes de mulheres, e os mais ricos, antes dos mais pobres, na média. A pesquisa mostra que mulheres pararam de trabalhar em média aos 57,3 anos, idade que supera a dos homens, 55,3 anos. A média geral é 56,3.
Vinte por cento dos brasileiros se aposentaram antes dos 50 anos –aposentadorias precoces são garantidas pelo atual sistema de tempo de contribuição, sem idade mínima exigida.
Para economistas defensores da reforma, além de pressionar os cofres do governo, o sistema agrava a desigualdade de renda brasileira.
Isso ocorre porque, em geral, os mais ricos se aposentam e continuam trabalhando, elevando suas receitas.
A média de idade mais baixa de aposentadoria é entre os brasileiros com ensino médio: 51,2 anos, sendo que 38% deles pararam antes dos 50.
A média mais alta é entre os com ensino fundamental: 57,8 anos, sendo que 35% deles trabalharam até após os 60. Na fatia com ensino superior, 60% se aposentaram entre os 50 e os 60 anos, e a média de idade é de 55,2 anos.
Algo semelhante ocorre em relação à renda: a idade média mais baixa está entre os que têm renda familiar mensal entre cinco e dez salários mínimos: se aposentaram aos 53,1 anos, sendo 29% deles antes dos 50 anos.
O levantamento do Datafolha mostra ainda que recebem aposentadoria do governo 68% dos brasileiros acima de 60 anos (73% dos idosos e 65% das idosas). A fatia é maior entre os idosos com ensino superior (75%, ante 68% dos com fundamental e 62% dos com ensino médio).
92% dos brasileiros dizem não investir
A aposentadoria pública é uma das fontes de renda mais comuns dos brasileiros com mais de 60 anos, mostra pesquisa Datafolha.
Recebem aposentadoria do governo 68% dos com 60 anos ou mais (73% dos idosos e 65% das idosas).
São pensionistas 28% das mulheres acima dos 60 anos; 10% dos homens.
Só 11% afirmam ter renda de previdência privada, fatia que cresce para 17% entre idosos com ensino superior e 16% entre os com ensino médio.
A porcentagem cresce entre os mais ricos: recebem aposentadoria privada 45% dos que têm renda individual acima de 10 salários mínimos e 31% dos que têm renda familiar acima desse patamar.
Embora uma parcela dos idosos brasileiros receba ajuda financeira da família, a maioria absoluta deles é capaz de garantir seu próprio sustento.
Só 7% dos maiores de 60 anos não são os principais responsáveis por pagar suas contas, sendo que em 6% dos casos são os filhos os principais responsáveis.
Há, porém, uma diferença grande de gênero: recebem ajuda financeira dos filhos 21% das mulheres idosas e 11% dos homens idosos. Outros 8% das mulheres e 3% dos homens recebem ajuda financeira de outras pessoas.
A dependência dos filhos é zero entre os que têm ensino superior e 2% entre os que ganham mais de cinco salários mínimos por mês.
O Datafolha mostra que 8 em cada 10 brasileiros temem ser dependentes financeiramente de outras pessoas, índice que cai para 7 em 10 entre os maiores de 60 anos.
Mas poucos têm reservas para emergências. Pelos dados da pesquisa, 92% dos brasileiros não têm investimentos, fatia que vai a 95% entre os idosos.
Mesmo entre os mais escolarizados e mais ricos, os sem investimento são muitos: 82% dos brasileiros graduados e 53% dos que ganham mais de dez mínimos.
Mais de um terço dos idosos (35%) não tem nem conta-corrente nem conta-poupança, porcentagem só superada pelos menores de 24 anos (43%). São 88% os brasileiros com mais de 60 anos que dizem contribuir para o pagamento das contas, a maior porcentagem entre todas as faixas etárias (a média é 74%).
Fonte: Folha de São Paulo, 19 de março de 2018
Fonte: sintracimento.org.br