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Especialistas apontam caminhos que podem permitir reeleição de Maia e Davi

Por Flávia Said 

Senador Davi Alcolumbre e deputado Rodrigo Maia em sessão de inauguração da 56ª Legislatura.

Jefferson Rudy/Agência Senado

Jefferson Rudy/Agência Sen doEspecialistas do Direito e da Ciência Política ouvidos pelo Congresso em Foco afirmam que a reeleição nas presidências da Câmara e do Senado é hoje expressamente vedada pela Constituição Federal, mas avaliam que há caminhos para autorizar a recondução. O movimento é perseguido nos bastidores pelos atuais presidentes – o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP) e o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), que buscam se viabilizar para a eleição marcada para fevereiro de 2021.

O impulso maior na articulação é dado por Davi, mas especialistas alegam que uma decisão favorável a ele seria extensiva a Maia. O presidente da Câmara já disse por diversas vezes que seu tempo na presidência está próximo do fim. “Mesmo que ele [Davi] consiga, eu não sou candidato. Eu acho que é legítimo ele pleitear, depois é uma decisão para o Supremo Tribunal Federal. Eu pessoalmente entendo que o meu ciclo de quatro anos, mais seis meses, é um ciclo longo”, afirmou Maia em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, no dia 4 de agosto.

artigo 57, parágrafo 4° da Constituição define que as Mesas são eleitas para um “mandato de 2 (dois) anos, vedada a recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subsequente”.

A proibição refere-se a uma mesma legislatura, que é o período que compreende um mandato de quatro anos de deputado federal. O mandato de senador da República, de oito anos, abre espaço para a possibilidade de exercício da presidência em duas ocasiões – de forma intervalada, no primeiro e terceiro biênios de seu mandato, ou sucessiva, no segundo e terceiro biênios, quando houver passagem de uma legislatura para a seguinte.

O cientista político e consultor em relações governamentais Carlos Muller vislumbra no horizonte três caminhos possíveis que podem permitir a recondução ao cargo: a aprovação de uma proposta de emenda à Constituição (PEC), uma nova interpretação do dispositivo por parte do Supremo Tribunal Federal (STF) e um parecer jurídico das Comissões de Constituição e Justiça (CCJ) das Casas.

Emenda constitucional

Para o advogado e cientista político Nauê Bernardo, sócio do Pinheiro de Azevedo Advocacia, qualquer possibilidade de mudança nessa regra deveria passar necessariamente por uma emenda à Constituição. A modificação do texto constitucional exige o voto de três quintos de deputados (308) e senadores (49), em dois turnos de votação.

As dificuldades para o trâmite da proposta poderiam ser superadas caso houvesse respaldo político das duas Casas, o que os especialistas avaliam não existir no momento. “Entendo que hoje não há clima favorável, na esfera política, para mudança do texto constitucional que possa viabilizar a reeleição de presidente da Mesa”, considera Nauê.

Além disso, para passar a valer, a PEC precisa ser aprovada pelas duas Casas. No caso da Câmara, onde pelo menos uma dúzia de nomes já estão colocados na disputa pela presidência, as barreiras são ainda maiores. “Como, politicamente, não seria possível mudar apenas a regra para o Senado, e crescem os interesses para a presidência da Câmara, bem como diminui o apoio a Maia no Centrão, uma PEC dificilmente seria aprovada”, afirma Muller.

Nova interpretação do STF

O segundo caminho, via Supremo Tribunal Federal (STF), já foi aberto por uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) apresentada pelo PTB, que questiona a recondução tanto na Câmara quanto no Senado. O relator da ação, ministro Gilmar Mendes, remeteu a decisão ao Plenário. Ainda não há data para o julgamento ocorrer nem se sabe qual é a posição que irá prevalecer na Corte.

“O Supremo pode sim interpretar a Constituição Federal de um modo favorável ao pleito de reeleição, mas entendo que seria algo bastante fora da curva, já que a letra da Constituição me parece bem expressa: não é possível a recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subsequente”, considera o advogado Nauê.

Muller acredita que Davi e aliados pressionarão os ministros por uma decisão favorável, que exige maioria simples, ou seja, seis votos dos 11 ministros. Na avaliação dele, a tratativa pode ter efeitos negativos, causando um desgaste da imagem de Davi perante o eleitorado, o Congresso e os ministros da Suprema Corte.

A advogada Andrea Hoffmann, especialista em processo civil e head de relações governamentais no Strozzi e Hoffmann Advogados, pondera que a Suprema Corte Brasileira é um tribunal que deve levar em conta questões de estabilidade política. Ela avalia que o STF pode “formar interpretação favorável à aplicação de reeleição, inclusive na mesma legislatura, caso seja importante para a estabilidade e os ministros estejam convencidos de uma interpretação legislativa adequada que pode ser construída”.

“Na prática, a evolução deste assunto dependerá de uma construção com os três poderes, considerando tempos atuais em que encaramos uma crise sem precedentes e que decisões como esta podem afetar a estabilidade política necessária”, estima.

Os especialistas lembram que Maia, que chegou à presidência da Câmara em julho de 2016, foi reeleito em 2017 dentro de uma mesma legislatura. Seu mandato anterior havia sido curto, uma espécie de “mandato tampão” para complementar o tempo remanescente da gestão de Eduardo Cunha (MDB-RJ), que havia renunciado e posteriormente teve seu mandato cassado.

A reeleição de Maia em 2017 teve apoio da Casa e foi apresentado parecer favorável na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que acabou não sendo apreciado. A recondução foi, inclusive, objeto de mandados de segurança no STF, que acabaram por considerar válida a reeleição. Segundo Hoffmann, o mandato tampão não foi considerado, dentro da interpretação dos ministros do STF, como válido para contar para nova eleição.

Para Nauê Bernardo, na ocasião não houve questão com o texto constitucional. “Por isso, nada impede que o Supremo inove juridicamente agora”, considera.

Parecer da CCJ

Um terceiro caminho, a recondução lastreada por um parecer da CCJ, é apontado pelo cientista político Carlos Muller como possibilidade. Ele explica que há diferenças na interpretação constitucional e especificidades no regimento interno de cada Casa.

No Senado, a possibilidade de recondução em legislatura diferente veio de um parecer da CCJ de 1998. À época, o senador Antonio Carlos Magalhães, o ACM, conseguiu continuar no cargo com a troca de legislatura. “Prevaleceu o entendimento de que a Constituição Federal veda apenas a recondução de membro eleito no primeiro ano da legislatura, caso queira concorrer no terceiro ano. Isto é, foi uma interpretação absolutamente literal, já que a Constituição só se refere à sessão preparatória da primeira sessão legislativa da legislatura”, explica Muller.

Na Câmara, o entendimento de que não se considera recondução a eleição para o mesmo cargo em legislaturas diferentes, ainda que sucessivas, já estava no regimento redigido em 1989. A argumentação é que isso não é recondução, mas uma “nova eleição”, pois a Câmara se renova a cada legislatura, diferentemente do Senado. Além do mandato tampão e dois dois anos à frente da Câmara, Maia preside a Casa pela terceira vez. Reeleito para um novo mandato de quatro anos como deputado federal nas eleições de 2018, Maia foi eleito pelos pares para comandar novamente a Casa no biênio 2019-2020.

Uma nova mudança é possível com respaldo em pareceres jurídicos das Casas, porém Muller pondera que agora o “esforço interpretativo” terá que ser bem maior. “Caso isso ocorra, o texto constitucional passará a ser mais a exceção do que a regra.”

Congresso em Foco

Fonte:sintracimento.org.br

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