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Valorização dos ativos brasileiros reflete melhora do crescimento e ambiente global favorável
Os preços dos ativos financeiros no mercado local têm apresentado melhora relevante desde meados de maio. O principal índice da bolsa de valores ultrapassou a marca de 130 mil pontos no início de junho, o real se valorizou e se aproximou da marca dos R$ 5,00 por dólar e os juros dos títulos públicos prefixados com vencimentos longos (2031) chegaram a ser negociados abaixo de 9,0%, após terem visitado níveis próximos a 10% há poucas semanas.
Uma parte da melhora certamente está associada aos ventos internacionais favoráveis. O crescimento das maiores economias globais começa a se firmar, com Estados Unidos e China em fase mais avançada de recuperação e a Europa começando a acelerar. O avanço da vacinação em larga escala, combinado com os estímulos vindos dos gastos dos governos e dos juros baixos, faz com que a demanda nesses países tenha importante recuperação.
Com a demanda global em alta, os preços de vários bens e serviços começam a se recuperar, inclusive algumas commodities que o Brasil exporta, que têm apresentado alta intensa nos últimos meses. Essa dinâmica favorece a balança comercial do Brasil, amplia a entrada de dólares no país e reforça o processo de valorização da moeda brasileira.
Em complemento ao fluxo comercial, a melhora da economia global e os sinais de paciência dos governos em remover quaisquer incentivos, sejam fiscais ou monetários, estimulam fluxos financeiros para ativos de mais risco, inclusive ações e dívidas de governos e empresas de países emergentes, sendo um fator adicional em favor da valorização das moedas desses países.
Fatores domésticos
Os fatores globais ajudam a entender a valorização recente dos ativos brasileiros, mas estão longe de explicar a totalidade dessa melhora. Pode-se afirmar isso pela análise comparativa de desempenho dos ativos do Brasil com alguns países de características similares, que colocam tanto a moeda brasileira quanto a bolsa em destaque frente aos nossos pares. A moeda brasileira, por exemplo, apreciou de R$ 5,60 para R$ 5,05 por dólar (10%), enquanto nossos pares tiveram apreciação de apenas 3% no mesmo período, o que nos remete à análise dos fatores específicos do Brasil que complementam a explicação para melhora recente nos preços.
Há elementos novos no cenário econômico do Brasil, surgidos nas últimas semanas. O primeiro a ser destacado é a revisão substancial na expectativa de crescimento da economia para 2021. Com a divulgação de diversas informações de abril e maio, está cada vez mais claro que os efeitos econômicos da segunda onda de covid foram bem mais discretos do que se previu inicialmente. Quando, em março, a segunda onda se intensificou, as projeções de crescimento foram revistas para entre 2% e 3%, com uma perspectiva de efeitos negativos relevantes no PIB do segundo trimestre. Entretanto, o que se viu, na prática, foi uma resiliência bem maior da economia à segunda onda da pandemia. O segundo trimestre não deve ter contração e, com isso, a retomada do segundo semestre será suficiente para gerar crescimento ao redor de 5% em 2021, uma revisão expressiva em relação ao projetado há poucas semanas.
O maior crescimento de 2021 deriva de alguns elementos, dentre eles:
- restrições à circulação menos intensas e duradouras do que as vistas na primeira onda de covid;
- maior adaptação dos agentes econômicos (empresas, famílias e governos) ao convívio sob restrições, com menos impacto agregado sobre consumo e oferta de bens e serviços;
- aprendizado do setor público em como reagir, com manutenção de obras e volta do auxílio emergencial;
- efeitos secundários da melhora da economia global sobre setores, cidades e regiões produtoras de alimentos, minério, siderurgia e petróleo.
Esses vetores combinados têm sido poderosos para dar dinamismo à economia, mesmo sob toda a incerteza ainda existente sobre a dinâmica da pandemia no Brasil.
A melhora substancial na perspectiva de crescimento traz outras duas implicações importantes para o cenário de 2021 e 2022. A primeira é que a melhora da atividade gerará acréscimo nas receitas do governo nos próximos meses. Essa melhora de receitas, combinada com despesas já estabelecidas para 2021, produzirá um déficit fiscal menor e um crescimento da dívida pública mais moderado. Assim, no curto prazo, reduz-se o risco de nova deterioração das contas públicas. Símbolo dessa dinâmica é a revisão das projeções para dívida bruta, que caminhavam na direção de 95% do PIB, há poucos meses, para algo mais próximo de 85% do PIB.
A segunda implicação, que também ajuda a parte fiscal no curto prazo, mas traz algum risco à duração do cenário positivo, é o aumento da inflação. Com a intensificação da retomada da demanda, em momento em que ainda há restrições de ofertas setoriais advindas da pandemia e pressões de custos de insumos relevantes, aumenta a chance de que a inflação continue pressionada nos próximos meses. Isto se reflete nas projeções para o final de 2021, com muitos analistas já estimando IPCA acima de 6,0%.
A inflação alta ajuda a fotografia fiscal no curto prazo, seja por aumentar as receitas vinculadas ao faturamento de empresas, corrigidos pela inflação corrente, seja pelo efeito sobre o PIB nominal, que também é corrigido pela inflação (deflator do PIB), o que reduz o denominador das relações dívida/PIB e despesas/PIB. É evidente que esse benefício para relação dívida/PIB da surpresa altista de inflação não deva ser a linha mestra da estratégia de estabilização fiscal. Mas, combinado com a melhora do crescimento e com sinais de rigor nas despesas para o futuro, causa uma percepção melhor sobre o risco fiscal no curto prazo.
O lado adverso da inflação alta é o risco de que o Banco Central tenha que reagir de forma mais intensa, com aumentos sucessivos de juros, para conter o risco de que a inflação alta não se propague para 2022 e adiante. Por isso, apesar da conjugação favorável do momento, que justifica a boa dinâmica recente dos preços de ativos brasileiros, não se deve perder de vista a necessidade de se perseverar no caminho de: equilíbrio das contas públicas, com controles dos gastos; criação de condições que facilitem a atuação dos empresários, com melhor infraestrutura e simplificação tributária; e manutenção do rigor do Banco Central, agora independente, para reconduzir a inflação a níveis adequados, contribuindo para preservação do poder de compra, em particular, daqueles menos favorecidos. Resta aproveitar o momento positivo e fazer os ajustes necessários para garantir uma saída saudável da economia no pós-pandemia.
Estevão Scripilliti é superintendente executivo do departamento financeiro e de investimentos da Bradesco Seguros
Fonte: VALOR INVESTE https://valorinveste.globo.com/blogs/estevao-scripilliti/coluna/o-que-explica-a-alta-da-bolsa-e-a-queda-do-dolar.ghtml
Fonte:sintracimento.org.br