Nova regra de contribuição à Previdência é mais dura que a de países “velhos”
Governo quer contribuição mínima de 25 anos para a Previdência. Países desenvolvidos exigem menos – mas o benefício também é menor
Diante do envelhecimento de sua população e de um déficit bilionário entre os recursos que entram e os que saem, o Brasil se prepara para alterar as regras de sua Previdência Social. Se a reforma for aprovada como está, o país deixará de ter um dos sistemas de aposentadoria mais generosos. Em certos aspectos, como o do tempo de contribuição, passará a ter regras mais rígidas que as de muitos países desenvolvidos (e mais envelhecidos que o Brasil).
Ao estipular a idade mínima de 65 anos, conforme a proposta do governo federal, o país segue a tendência da maioria dos países desenvolvidos, que também vêm unificando as idades entre homens e mulheres.
Por outro lado, o tempo mínimo de contribuição, que deve passar de 15 para 25 anos, é consideravelmente maior que o praticado lá fora, bem como a marca necessária para ter acesso integral ao benefício, de 49 anos. Quem contribuir pelo mínimo de 25 anos receberá 76% do benefício.
Os países desenvolvidos são menos rígidos nesse quesito. Em alguns, nem sequer há tempo mínimo de contribuição: o trabalhador recebe proporcionalmente em relação ao tempo que contribui. Em outros, há um tempo mínimo, mas bem menor que o brasileiro.
Na Alemanha, é preciso trabalhar apenas cinco anos para ter acesso a alguma fatia da aposentadoria. Nos EUA e no Reino Unido, 10 anos. Na Itália, 15 anos.
Benefício generoso
Mas nos países em que é possível se aposentar com menos tempo de contribuição, o benefício também é menor, podendo até ser inferior ao salário mínimo – o que não é permitido no Brasil.
“O sistema brasileiro é significativamente mais generoso que os sistemas de Previdência de outros países em razão da indexação ao salário mínimo, que teve crescimento real de mais de 70% em uma década, e da alta proporção média do benefício em relação ao salário”, diz Jens Arnold, economista sênior da OCDE.
Nos países da organização, por exemplo, o valor médio que um trabalhador de renda média obtém com a aposentadoria representa 53% de seu salário, segundo a OCDE. Já no Brasil, a aposentadoria equivale, em média, a 70% dos rendimentos do trabalhador.
“Há dois modos de enxergar a Previdência. Em alguns países, há um link mais direto entre o que você coloca e o que você tira. Já em outros, a Previdência é vista como uma poupança mínima, que tem de ser complementada com outras reservas e previdências privadas.”
Um exemplo, cita Arnold, é o Reino Unido, onde o aposentado recebe em média uma fatia de apenas 21,6% de seu salário. “O Brasil vai ter de caminhar nessa direção, de ver a Previdência como um complemento”, diz. “O problema é que os fundos de previdência privada não são tão grandes como em outros países e não contemplam a maior parte da população.”
Idade mínima
Nos países desenvolvidos, cuja maioria já passou por um período de transição demográfica, a idade mínima é dominante – e vem subindo. A marca de 65 anos, que o Brasil quer adotar, já é praticada em vários lugares, como Canadá, Dinamarca, Suécia, Austrália, Japão, Finlândia, Espanha e Nova Zelândia.
Em muitos deles, a idade vai aumentar nos próximos anos, de forma gradativa. Na Alemanha e na Dinamarca, a idade mínima será de 67 anos em 2022; na Austrália, em 2023; na Espanha, em 2027; no Canadá, em 2029.
Em outros países, a idade mínima já é maior do que 65 anos, e o patamar também deve aumentar. Na Grécia, castigada por uma grande crise econômica, a idade mínima subiu para 67 anos, como uma das exigências da União Europeia para o pacote de ajuda fiscal. Nos Estados Unidos, subirá de 66 para 67 anos até 2022.
Na Itália, onde homens se aposentam com 66 anos e 3 meses e mulheres com 63 anos e 9 meses, haverá uma unificação, para ambos, de 67 anos em 2021. Os dados são do levantamento Pensions at a Glance 2015, da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Transição gradual
Para o professor de Direito Previdenciário da PUC-SP Walter Balera, a idade mínima é necessária para a reforma do sistema previdenciário brasileiro, mas teria de ser implementada de forma gradativa, como vem ocorrendo no exterior.
“Muitos países estabeleceram o modelo de aumentar a idade mínima mediante o aumento da expectativa de vida. O pioneiro foi o Reino Unido, depois vieram outros, como Itália e Espanha”, afirma.
“Deve, sim, haver um aumento da idade, mas com algum espaçamento, de forma paulatina. Mudar de uma hora para a outra tanto a idade mínima quanto o tempo mínimo de contribuição quebra a expectativa das pessoas, ainda mais com um mercado de trabalho que as expulsa cada vez mais cedo.”
Além disso, pondera Balera, a expectativa de vida do brasileiro, atualmente na casa dos 75 anos, é inferior à observada nos países ricos – na média dos 34 países que integram a OCDE, já está acima dos 80 anos. Assim, o brasileiro teria menos tempo para desfrutar do benefício. “Calibrar a idade mínima pela expectativa de vida seria uma boa opção”, reforça o professor.
Fonte: Gazeta do Povo / Estadão Conteúdo, 14 de março de 2017.
Fonte: fetraconspar.org.br