Uma economia sem fôlego
A recessão passou, mas a economia patina e a atividade econômica não engrena. Por quê?
A economia brasileira continua a patinar, mesmo depois da recessão que durou do segundo trimestre de 2014 ao quarto trimestre de 2016 e do fraco crescimento registrado nos dois últimos anos. Os juros estão baixos para padrões brasileiros e empresas e famílias estão menos endividadas do que no auge da crise, mas a atividade econômica não engrena.
Hoje, vários bancos e consultorias projetam uma expansão do Produto Interno Bruto (PIB) na casa de 1,5% ou até menos para 2019, número não muito diferente do 1,1% registrado em 2017 e também em 2018. Visto de hoje, nenhum componente da demanda — o investimento, o consumo das famílias, o consumo do governo e a diferença entre exportações e importações — parece capaz de intensificar o ritmo de recuperação da economia.
A recessão deixou enorme ociosidade na economia, como fica evidente na elevada taxa de desemprego e no baixo nível de utilização de capacidade instalada na indústria. Há muitos trabalhadores sem emprego e as empresas têm como produzir muito mais do que hoje, sem a necessidade de ampliar a capacidade produtiva. Com tanta ociosidade, é possível crescer com mais força sem pressionar a inflação por um longo período.
Na virada do ano, a expectativa era de que isso ocorreria em 2019. Haveria a tão esperada aceleração da recuperação cíclica. Com juros baixos e a retomada na confiança de empresários e consumidores — e passadas as eleições presidenciais —, o investimento e o consumo, enfim, deslanchariam. Não foi o que se viu, pelo menos por enquanto.
A melhora na confiança de empresários e consumidores sofreu uma interrupção. Um problema é que seguem razoavelmente elevadas as incertezas em relação à reforma da Previdência, tida como fundamental para corrigir o desequilíbrio das contas públicas. A avaliação crescente é de que a tramitação da proposta será mais demorada do que se imaginava inicialmente, devendo também ser aprovada uma versão mais desidratada do projeto original do governo, que prevê a economia de R$ 1,25 trilhão em dez anos.
A questão é que há problemas na articulação política do governo com o Congresso.
Até o momento, não se vislumbra que componente da demanda puxará a atividade econômica. “Recuperações cíclicas são comandadas pela intensidade do crescimento da demanda agregada, e não há qualquer sinal de aceleração”, como resumem os economistas da A.C. Pastore & Associados.
As exportações não deverão puxar o PIB, num cenário marcado pelo crescimento global mais fraco. Além disso, a indústria do país tem sérias dificuldades para competir no exterior. O impulso tampouco virá dos gastos do setor público, dada a situação de penúria fiscal do governo federal e de grande parte dos Estados e municípios.
As perspectivas para o consumo das famílias também são desanimadoras. O desemprego no primeiro trimestre ficou em 12,7%, o equivalente a 13,4 milhões de pessoas. Para completar, grande parte dos postos de trabalho criados é de má qualidade, sem carteira assinada. Com isso, as famílias tendem a continuar cautelosas e a consumir pouco.
Resta o investimento que, até aqui, não dá sinais de que vá crescer com mais força. Primeiro, porque o nível de ociosidade é muito grande, tornando desnecessários investimentos em aumento da capacidade produtiva.
A incerteza em relação à reforma da Previdência também segura o investimento. Sem a mudança no sistema de aposentadorias, a situação das contas públicas seguirá complicada, com a alta insustentável da dívida do governo. Enquanto a reforma não estiver encaminhada, muitas empresas preferem não investir, pelo medo de que haja uma nova desorganização da economia. A intensificação das concessões de infraestrutura poderia acelerar o investimento, mas essas iniciativas ainda não ganharam fôlego. O impacto maior delas deve ficar para o ano que vem.
Em resumo, o crescimento não deslancha. A situação pode ficar um pouco melhor com a aprovação da reforma da Previdência, o que tende a ocorrer mais para o fim do segundo semestre, segundo vários analistas.
Se houver a percepção de que será aprovada uma versão relativamente robusta da proposta, as empresas podem se sentir mais confiantes para investir mais.
Nesse cenário, os juros devem seguir em níveis baixos por bastante tempo, podendo até cair mais, especialmente se houver a aprovação da reforma da Previdência. O Banco Central (BC) teria mais conforto para baixar a Selic com a situação das contas públicas mais equilibrada. Por outro lado, mesmo se a atividade econômica ganhar fôlego, os juros devem demorar para subir. Com a grande ociosidade existente na economia, as pressões inflacionárias não vão aparecer de imediato. O investidor, tudo indica, vai conviver com taxas baixas por muito tempo.
Valor Investe
Fonte:sintracimento.org.br