TSE discute cerceamento de defesa em ação sobre abuso eleitoral de Bolsonaro
O Tribunal Superior Eleitoral retomou, na noite desta terça-feira (9/6), o julgamento de duas ações de investigação judicial eleitoral que apuram ataques cibernéticos em grupo do Facebook para beneficiar a campanha da chapa formada por Jair Bolsonaro e Hamilton Mourão na eleição de 2018. O caso foi retomado com voto-vista do ministro Luiz Edson Fachin e acabou novamente paralisado por pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes.
A alegação dos autores das ações é que antes do primeiro turno do pleito de 2018, ainda em setembro, o grupo virtual “Mulheres Unidas contra Bolsonaro”, que reunia mais de 2,7 milhões de pessoas no Facebook, sofreu ataque de hackers que alteraram o conteúdo da página para apoiar o então candidato. Dias depois, Bolsonaro publicou no Twitter agradecimento ao apoio.
Até esta terça-feira, só havia votado o relator dos processos, o corregedor-geral eleitoral, ministro Og Fernandes, que se manifestou pela improcedência das ações. Ele entendeu que as investigações sobre o ataque não foram conclusivas em relação à autoria e acrescentou que o fato não teve gravidade suficiente para alterar a normalidade ou a legitimidade da eleição de Bolsonaro.
Dentre as preliminares destacadas, os autores alegaram cerceamento de defesa pelo indeferimento de pedidos de produção de prova cibernética a fim de apurar quem foram os autores do ataque. Neste ponto, abriu divergência o ministro Luiz Edson Fachin, em discussão que acabou por dominar o Plenário virtual do TSE durante a sessão.
Produção de prova
Para além das ações no TSE, duas apurações sobre o ataque virtual ocorreram: um pedido de abertura de inquérito na 41ª Zona Eleitoral da Bahia, que teve o arquivamento pedido pelo Ministério Público Eleitoral da Vitória da Conquista e deferido pelo juízo, por não se identificar prática de crime eleitoral; e outra pela Polícia Civil da Bahia, em inquérito ainda em andamento e que não identificou autor até o momento.
O pedido dos autores para produção de prova pericial foi negado pela relatoria em dois momentos. O primeiro, ao concluir pela possibilidade de usar a chamada “prova emprestada” junto à polícia baiana, possibilidade ainda inviável. Posteriormente, devido ao alcance limitado dos efeitos que poderia ter produzido na eleição presidencial e diante da necessidade de preservar a duração razoável do processo.
Para o ministro Luiz Edson Fachin, essa negativa configura cerceamento de defesa, pois a produção de prova pode demonstrar vínculo objetivo e subjetivo entre o autor da conduta tida como abusiva e os investigados Jair Bolsonaro e Hamilton Mourão. Trata-se de direito da parte que encontra relevância jurídica palpável para sua concessão.
“A questão temporal não pode servir como óbice à observância de garantias constitucionais referentes ao desenvolvimento regular do processo e do próprio direito de ação. Deve, portanto, o direito à razoável duração do processo ser lido à luz dos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, e não como limitador destes”, afirmou.
Mensuração dos reflexos eleitorais
A divergência foi acompanhada por outros dois membros do TSE. O ministro Carlos Velloso ressaltou que o TSE deve primar pela instrução adequada do feito pensando inclusive no julgamento de eventual e futura questão sobre o caso, a ser feito pelo Supremo Tribunal Federal.
Já para o ministro Tarcísio Vieira de Carvalho Neto, ao pedir informações levantadas pela polícia baiana em relação às investigações do caso, o relator dos casos — à época, ministro Jorge Mussi — acabou por deferir a produção de prova, ainda que como prova emprestada.
Para ele, é inviável aferir a gravidade da conduta possivelmente perpetrada pelos acusados nesse momento, pois é a prova sobre a autoria do ilícito que pode ajudar na definição da gravidade e a repercussão no contexto das eleições de 2018.
Além disso, lembrou que a Lei da Ficha Limpa de 2010 definiu que a mensuração dos reflexos eleitorais da conduta não mais se constitui fator determinante para a ocorrência do abuso de poder, sendo relevado pelo desvalor do comportamento. Em se tratando de abuso de poder, examina-se gravidade na conduta, não a potencialidade para interferir em resultado da eleição matematicamente.
“Se esse exercício apriorístico valorativo fosse passível de ser realizado em sentido negativo, nem o processamento na inicial seria viável, pela patente falta de interesse de agir dos autores, o que não ocorreu”, ressaltou.
Falta de gravidade
Por entendimento diverso, o ministro Luís Felipe Salomão foi o único a acompanhar o relator ao negar o cerceamento de defesa na sessão desta terça. Para ele, independentemente da autoria da conduta, é notória a ausência de gravidade, por falta de prejuízo à lisura e à legitimidade das eleições.
O entendimento é baseado também na alteração promovida pela Lei da Ficha Limpa. Para o ministro Salomão, normalidade e legitimidade das eleições são fatores que atestam a gravidade da conduta, que não poderiam ser afetados por uma invasão digital que teve duração de cerca de 24 horas.
“A conduta, embora não seja irrelevante, teve curtíssima duração, sem nenhum elemento capaz de revelar efetivo alcance ao eleitorado”, destacou o ministro, para quem não poderia ser identificado eventual abuso de poder econômico por Jair Bolsonaro e Hamilton Mourão no caso. “Penso que a prova a ser produzida não acrescentaria muito ao desfecho do caso em exame”, concluiu.
O ministro Alexandre de Moraes pediu vista para analisar elementos e argumentação trazidos nos votos apresentados nesta terça-feira.
Aije 0601401-49
Aije 0601369-44
Danilo Vital é correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.
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