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Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Ladrilhos Hidráulicos, Produtos de Cimento, Fibrocimento e Artefatos de Cimento Armado de Curitiba e Região

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Os impactos da crise na indústria e o desemprego no Brasil

 

 

 

"Aos trabalhadores e trabalhadoras interessa enormemente retomar a indústria nacional como vértice de nosso desenvolvimento. Para tanto, estabelecer alianças com esse compromisso será fundamental para percorrer um caminho virtuoso que dê conta dos desafios impostos ao país nesta etapa", defende o estudo.

De acordo com a nota, as "transformações na base produtiva apresentam questões de fundo para os trabalhadores, tais como, (a) alterações no próprio perfil da classe operária, que passa a necessitar de maior nível de escolarização e renda relativamente mais elevada, com efeitos sobre sua própria identidade e sentimento de pertencimento à classe; (b) efeitos extraordinários sobre a produtividade do trabalho, derivando numa expressa diminuição quantitativa do proletariado industrial e sua sofisticação".

Ao comentar a iniciativa de elaborar uma nota técnica sobre o tema, o presidente da CTB, Adilson Araújo, destacou que "diante das amargas estatísticas, da avalanche de perdas de direitos, do desemprego alarmante e do sucateamento do parque produtivo nacional, a Central não só empenha esforços em entender essa realidade como também investirá pesado numa campanha nacional em defesa da indústria nacional, do emprego e da retomada do crescimento econômico, com geração de emprego e distribuição de renda".

Ele destaca que a proposta é unificar amplos setores – sociais, políticos e do mundo do trabalho – em torno de uma nova agenda política e econômica, que denuncie o desmonte do Estado Nacional, a ofensiva contra a classe trabalhadora e o projeto entreguista liderado pela gestão de Michel Temer.

Leia íntegra do estudo: 

 

Nota Técnica CTB

A crise na Indústria e os trabalhadores.

Superar a crise tendo a reindustrialização como vértice de um novo projeto nacional de desenvolvimento com valorização da produção e do trabalho.

Ronaldo Carmona[1]

Julho de 2017

Numa verdadeira epopeia da nação e da nacionalidade, o ciclo longo nacional-desenvolvimentista, teve como resultado a transformação do Brasil numa nação industrial. Nessa grande transformação da base material do poder nacional, entre 1947 e 1980, o PIB brasileiro cresceu em média 7% ao ano, numa arrancada praticamente sem paralelo na história contemporânea, apenas igualável ao feito chinês, que ocorre desde 1978, em outras condições.

O ciclo desenvolvimentista[2] foi produto de um consenso nacional, representado pela busca da industrialização como ideia-força mobilizadora das energias dos brasileiros e do Estado nacional, resultando num imenso e exitoso esforço.

Há quase quatro décadas, contudo, o Brasil vive um período de semi estagnação na geração de riquezas: medido em termos per capita, o PIB brasileiro, entre 1981 e 2014, cresceu menos que 1% (a média de 0,94%), contra cerca de 4% ao ano, em média, entre 1930 e 1980.

Esta longa semi estagnação conheceu exceção relativamente virtuosa num breve ciclo entre 2005-2010, sob a presidência de Lula, em grande medida, segundo certo consenso entre os analistas – heterodoxos ou ortodoxos –, devido a fatores preponderantemente externos – o boom no preço das commodities, que, ao lado de opções de política econômica de então, permitiram a existência de um modelo de crescimento baseado na demanda (consumo).

Desde o 2º trimestre de 2014, entretanto, segundo os dados do IBGE, o Brasil encontra-se em recessão.

A longa semiestagnação que ocorre desde o fim do ciclo nacional-desenvolvimentista, apresenta uma brutal queda da participação da indústria de transformação no Produto Interno Bruto (PIB): desde 1985, quando atinge 21,6% do PIB, seu auge, ocorre uma regressão profunda na estrutura produtiva brasileira, que em 2014 chega a 11,4%, mesmo patamar de 1947. Há analistas que veem indicações que hoje, o número já poderia mostrar uma participação inferior a um digito, numa regressão aos índices do início do esforço industrializante (Revolução de 1930) e talvez similar ao início do século XX, quando o país ainda era uma nação predominantemente agrária, dependente das exportações de café.

A primarização da pauta de exportações brasileiras, aliás, mostra seus números na queda da participação das manufaturas em seu total, recuou de 59% em 2000 para 39% em 2013. A participação brasileira nas exportações mundiais de manufatura recuaram de 0,82% para 0,59%, entre 2003 e 2014.

A presente Nota Técnica, produzida a pedido da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), além desta breve introdução, buscará apresentar as características estruturais e conjunturais do processo de desindustrialização brasileira e discutirá medidas não apenas para reverte-la, mas para impulsionar um novo ciclo de reindustrialização nacional, isto é, de aumento da participação relativa da indústria como proporção do PIB. Para tanto, seguiremos o seguinte roteiro:

(1) breve apresentação da história da luta pela industrialização no Brasil (do Brasil independente ao longo ciclo nacional-desenvolvimentista);

(2) discussão sobre porque a indústria permanece sendo determinante para o desenvolvimento das Nações, com base, (1) na literatura econômica e (2) num breve exame das tendências contemporâneas da indústria e das políticas industriais no mundo;

(3) apresentação de dados mais recentes, sobre a grave crise brasileira sob a perspectiva da indústria, para situar aonde estamos hoje;

(4) discussão sobre o período mais recente, relacionado a última etapa da desindustrialização brasileira e as tentativas de contê-la, via experiências de política industrial e de ciência, tecnologia e inovação nos governos Lula e Dilma, o fracasso/sabotagem do experimento desenvolvimentista e o aparecimento do governo Temer, abertamente hostil a produção e ao trabalho;

(5) Por fim, defenderemos uma estratégia de re-industrialização nacional.

***

1) A luta pela industrialização no Brasil (dos debates do século XIX ao longo ciclo nacional-desenvolvimentista)

Como dissemos na introdução deste trabalho, a experiência brasileira de industrialização, seu histórico, é singular no mundo, empreendendo esforço que é paradigma na literatura sobre o desenvolvimento econômico.

Afinal, como não observar a transformação de um país agrário-exportador para uma das grandes economias industriais do mundo a partir dos “50 anos” de nacional-desenvolvimentismo deflagrados com a revolução de 1930? Sim, o Brasil durante boa parte do século XX, cresceu a “taxas chinesas”, revolucionando sua base material e permitindo se situar entre as grandes economias do mundo.

A consciência desta rica trajetória, dos esforços empreendidos para realizá-la, é fundamental sobretudo para que as gerações atuais tenham consciência da necessidade de preservar e mesmo ampliar a condição da indústria como vetor chave do desenvolvimento nacional[3].

No caso brasileiro, a luta pela industrialização é histórica e vem das origens de nossa construção nacional. Rigorosamente, podemos situá-la antes da própria independência, nas ações visionárias do Marques de Pombal, grande estadista modernizador português, em favor do dinamismo econômico dos domínios ultramarinos.

Efetivamente, a primeira tentativa para se promover a industrialização no Brasil datam do início do século XIX, a partir do inédito fato na historiografia mundial, a transferência da sede do vasto império mundial português ao Rio de Janeiro em 1808.

Sendo sede da coroa portuguesa, outro homem de visão alargada, D. Rodrigo de Sousa Coutinho, o Conde de Linhares, conselheiro do príncipe regente, argumentou em defesa da indústria, tendo em vista que em sua opinião Portugal, não apenas formalmente mas de fato, não mais constituía o centro da monarquia português, ao passo que no Brasil se constituía “a possibilidade de criar um poderoso império”.

Com o alvará de 28 de abril de 1809, o príncipe regente D. João VI propõe inaugurar a era industrial no Brasil, concedendo a isenção de direitos aduaneiros às matérias-primas necessárias às fábricas nacionais, isenção de imposto de exportação para os produtos manufaturados do país e a utilização de produtos nacionais para o fardamento das tropas reais. Esta pode ser considerada a primeira legislação pró-indústria, num Brasil todavia não emancipado, mas reino unido a Portugal. 

Além disso, este alvará de Dom João VI concedia privilégios exclusivos, por 14 anos, aos inventores ou introdutores de novas máquinas, no que, em linguagem contemporânea, foi a primeira política industrial inspirada em princípios inovativos concebida no Brasil. Adicionalmente, o mesmo alvará determinava a distribuição anual de 60 mil cruzados, produto de uma loteria do Estado, “às manufaturas que necessitassem de auxílio, particularmente as de lã, algodão, seda, ferro e aço” (Vilela Luz, 1975).

A decisão de Dom João VI anulava alvará de autoria de sua mãe, Dona Maria “a louca”, de 1785, que proibia a produção de manufaturas no Brasil e também, na prática, contraditava medida dele próprio, quem em janeiro de 1808, lançava o decreto de abertura dos portos às nações amigas, em algo que é lido pela historiografia como uma retribuição à proteção inglesa à transferência da Corte ao Brasil, após a ocupação de Portugal pelas tropas napoleônicas. Essa dependência, aliás, já manifestada no acordo de 1703 – o Tratado de Methuen – no qual Portugal aceitava comprar exclusivamente da Inglaterra produtos manufaturados, obrigando-se também a não produzir nenhum produto industrial, quer na metrópole, quer nas colônias. Daí a importância histórica, fundadora, para a decisão brasileira de iniciar sua industrialização, no alvará de abril de 1809.

Na transição para a Independência, destaca-se o papel de José Bonifácio de Andrada e Silva – o libertador do Brasil –, quem, através de sucessivos escritos, defendeu a indústria no Brasil como forma de consolidação da unidade nacional. Cabe observar, por exemplo, suas instruções aos deputados paulistas que viajaram às cortes de Lisboa, no momento imediatamente anterior à Independência. Autor de projeto avançado e progressista, em grande medida até hoje atual, José Bonifácio seria apeado do poder por meio de uma conspiração agrário-escravocrata.

Marco importante na organização dos defensores da industrialização brasileira, é a fundação, em 1828, da Sociedade Auxiliadora da Industria Nacional (SAIN).

A chamada Tarifa Alves Branco, de 1844, que estabeleceu algumas medidas visando proteger a indústria brasileira nascente, foi o próximo passo na longa luta pela manufatura, pois “entusiasmou empresários pioneiros, que entraram na segunda metade do século XIX considerando-se prontos para atender ao mercado consumidor e fornecedor de matérias-primas” (CNI/Firjan, 2008).

O ministro Manuel Alves Branco, que ocupou o ministério da Fazenda em quatro oportunidades entre 1839 e 1848, dizia que “uma Nação não pode fundar todas as suas esperanças na lavoura, na produção de matérias brutas, nos mercados estrangeiros”. É tido como um seguidor das ideias de Alexander Hamilton, que no seu clássico relatório sobre as manufaturas (1791), forneceu a base de ideias que permitiu a industrialização norte-americana – base para este país, no século XX, ascender a condição de principal potência mundial.

No mesmo período, não se pode deixar de ressaltar a importância de iniciativas pioneiras de homens com olhos no futuro, caso marcadamente de Irineu Evangelista de Sousa, o Barão de Mauá.

O ano de 1881 marca o surgimento da Associação Industrial, “um divisor de águas na institucionalização da luta pela industrialização nacional” (Carrasco/Lino, 2009).

A virada do século já encontraria o Brasil com uma incipiente industrialização, ainda que a atividade amplamente dominante fosse a agrícola, especialmente a da exportação de café. O censo de 1907, por exemplo, indica a existência de 2.988 industrias e 136 mil trabalhadores.

Este período foi precedido, na transição entre a Monarquia e a República, pelo chamado Encilhamento (1890-1891), política econômica que beneficiara indiretamente a indústria.

O ministro Rui Barbosa, figura mais destacada deste período, defendia que “a República só se consolidará entre nós sobre alicerces seguros, quando as suas funções se firmarem na democracia do trabalho industrial”. Rui Barbosa, no entendo, foi sucedido por Joaquim Murtinho, um radical liberal opositor da industrialização nacional no governo Campos Salles (1898-1902), auge do atraso da República Velha.

Mas foi com a Revolução de 1930, com a subida ao poder do presidente Getúlio Vargas que marcou o início do período de Industrialização nacional, que passa a ser, efetivamente, um prioridade nacional. Em especial, a participação do Exército brasileiro na segunda grande guerra faz surgir condições para que o país constituísse uma grande e moderna siderurgia que produzisse o aço necessário a um parque industrial que crescia e diversificava.

Os anos 1940 marcaram debate ideológico chave para o êxito da ideia de industrialização nacional, no episódio que ficou marcado como a controvérsia Simonsen – Gudin. Seus protagonistas, de um lado Roberto Simonsen, convicto industrialista e de outro, Eugenio Gudin, liberal e defensor da manutenção da agricultura como atividade econômica principal, travaram embate, por meio de relatórios, que foi determinante para o êxito do ciclo desenvolvimentista.

O segundo governo Vargas marcou a criação de dois novos instrumentos icônicos para o ciclo de industrialização brasileira: o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE, atual Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES), em 1952, e a Petrobras, em 1953. Vargas, em seu segundo mandato, contava ainda com uma assessoria econômica de alto nível, formada por figuras próceres na defesa do desenvolvimento brasileiro – a começar de Inácio Rangel –, que deixaria marcas no debate sobre o projeto nacional.

A seguir, no Plano de Metas levado a cabo pelo presidente Juscelino Kubitschek, em 1956, se destaca, como um de seus vetores, a busca de desenvolver a indústria de Base no Brasil. Inúmeras novas e grandes fábricas são inauguradas no período e empresas multinacionais, como as automobilísticas, começam a instalar-se no Brasil – caso da fábrica da Volkswagen, em São Bernardo do Campo, em 1957. Visionário, quanto ao desafio da integração nacional, JK também cria a Zona Franca de Manaus, outro marco da história da industrialização brasileira, que efetivamente começaria a funcionar em 1967. 

O período dos governos militares, especificamente quanto a economia, foi, após curta experiência liberal em seu início, francamente ativo na promoção do desenvolvimento econômico via industrialização – foi a época que é conhecida como milagre econômico, onde as taxas de crescimento industrial superaram, no auge, a casa de um dígito.

A crise mundial de 1973 força a uma desaceleração da economia; mas o novo presidente, General Ernesto Geisel, não aceita este vaticínio e opta por uma outra saída da crise, lançando, em 1975, o II PND (Plano Nacional de Desenvolvimento) – outro momento simbólico na história da industrialização da nação. Com o II PND – evento que marcaria, pode-se dizer, o encerramento do ciclo longo desenvolvimentista –, ocorre um novo surto de industrialização no país, sobretudo das industrias básicas, além de fortes investimentos em energia, inclusive como forma de diminuir a dependência do petróleo, deflagrador da crise mundial de 1973.

O iniciar dos anos 1980 entretanto, inaugurariam duas décadas perdidas, pondo fim a grande saga industrialista do Brasil; desde 1985, como dissemos, a participação da indústria no PIB declina.

Em síntese, ao analisar nossa longa história de luta pela industrialização, é preciso tirar lições, na qual veremos uma disjuntiva que se apresenta todavia atual. Como afirmam Carrasco Bauza e Luis Lino (2009:281),

“Desde que o Brasil se tornou independente de Portugal, em 1822, os ensinamentos do Sistema Americano de economia política, elaborado por Alexander Hamilton, Mathew e Henry Carey, Friedrich List e outros autores[4], estiveram no centro de uma contenda travada entre as duas facções que disputavam a primazia de direcionar o futuro do país.

De um lado, estava o grupo de ‘industrialistas nacionalistas’, que, embora precariamente organizado em grande parte do tempo, tinha o propósito de utilizar a expansão das manufaturas como móvel de um processo de modernização nacional.

Do outro, alinhava-se uma casta de terratenentes, rentistas, especuladores e intermediários comerciais, cujo ‘projeto de vida’ se limitava à apropriação dos excedentes de capital disponíveis para aplicação em bens de raiz, terras e outras atividades que lhe permitissem ‘viver de rendas’”.

Qualquer semelhança com a realidade de nossos dias, como veremos, não é mera coincidência.

2) Porque a Industria permanece sendo determinante para o desenvolvimento das Nações? Notas teóricas e contemporâneas.

Nesta sessão, vamos buscar responder a questão acima a partir de autores clássicos do debate sobre o desenvolvimento, bem como pelo exame das tendências contemporâneas quanto ao debate sobre relação entre indústria e desenvolvimento no mundo. 

A indústria, especialmente a manufatura voltada a transformação, segue na atual quadra do debate sobre o desenvolvimento econômico, fator principal de riqueza das Nações. Afinal, grande parte do argumento teórico que fundamentou a necessidade de industrialização como caminho para a prosperidade e riqueza nacional continua essencialmente válido. A literatura econômica apresenta a relevância da manufatura como base para aumentar renda per capita, pois, de seu desenvolvimento, decorre a elevação da produtividade média da economia derivado do direcionamento da produção para os setores que geram maior valor adicionado (produtos mais complexos).

Autores como Rosentein-Rodan (1943), Prebisch (1949), Lewis (1954) e Furtado (1961) estão entre os pioneiros a apontar a relevância da manufatura no processo de desenvolvimento. Afinal, é nesse setor que ocorrem as inovações tecnológicas que possibilitarão a produção de bens mais sofisticados, a mudança estrutural e o avanço da produtividade entre setores da economia que elevarão a renda per capita da economia.

Podemos observar três argumentos fundamentais sobre os efeitos potenciais à economia relacionados ao peso relativo do setor de manufatura:

– efeitos na produtividade devido ao efeito composição. Trata-se de “mudança no nível de produtividade de uma economia provocada pelo deslocamento de trabalhadores entre os setores que apresentam diferentes índices de produtividade de mão de obra”. Ou seja, com a industrialização, migram trabalhadores de setores básicos da economia – como a agricultura e os serviços tradicionais – para as fábricas, gerando enormes ganhos de produtividade e, a partir disto, da renda nacional e do trabalho. Empregos mais qualificados é resultado bastante visível do aumento da presença da Industria na economia; 

– efeitos de dinamismo econômico relacionado ao encadeamento entre os setores. Argumento “com vida longa entre os estruturalistas, como Albert Hirschman”, “enxerga nas manufaturas a virtude de demandar muitos insumos de outros setores, dinamizando desta forma a economia como um todo”. Exemplo “é o setor automobilístico, cuja atividade puxa consigo os segmentos de autopeças, aço, borracha, plásticos, etc.”. Ou seja, a capacidade que a produção de um determinado bem industrial tem em mobilizar e estruturar uma cadeia produtiva de fornecedores de outros bens e insumos tem efeito dinamizador sobre toda a economia. 

– Por fim, destacam as externalidades de uma economia de aglomeração (formação de cluster) associadas à atividade de P&D (Pesquisa e Desenvolvimento). A “economia do conhecimento”, cujo exemplo mais emblemático é o vale do Silício, “é caracterizada pelo extraordinário dinamismo em termos de inovação e tecnologia, com transbordamentos que escapam à apropriação individual pelas empresas. Como tal, configura-se num caso típico em que o estimulo da política pública se justifica em termos de eficiência econômica”. Assim, “as externalidades de P&D em economias de aglomeração são um dos poucos consensos no debate entre ortodoxos e heterodoxos sobre política industrial. É argumento válido, com copiosas evidencias empíricas”. Trata-se aqui dos amplos efeitos que a industrialização tem, se realizada numa escala ampla, sobre a elaboração de novos produtos e processos (inovação), que é o fator de maior dinamização de uma economia[5].

Estes são, resumidamente, alguns dos argumentos, clássicos e atuais, sobre a alta relevância da importância de uma nação ter na indústria a base de sua atividade econômica.

Ao mesmo tempo, as políticas contemporâneas das grandes nações industriais – China, EUA e Alemanha -, mostram que estes países seguem tendo na manufatura vértice do seu desenvolvimento.

Duas recentes Cartas do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI)[6], mostram que “há uma grande atividade nas políticas industriais ao redor do mundo no presente momento”. Segundo os relatórios, “nos principais países inovadores da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), como Alemanha, Coreia do Sul, Estados Unidos e Japão, ocorreram várias iniciativas de integração das estratégias nacionais de inovação nos programas de competitividade e de política industrial. Nas principais economias emergentes, o potencial de contribuição da pesquisa e inovação para o crescimento econômico e produtividade também tem sido enfatizado nos programas nacionais”.

A intensificação das transformações produtivas e tecnológicas, pela busca de uma nova revolução tecno-científica, é – ao lado de sua manifestação antípoda, a financeirização –marca do capitalismo contemporâneo.

Foi, por exemplo, como tema principal da edição 2016 do Fórum de Davos, o grande conclave anual da burguesia em escala global, sob o tema quarta revolução industrial – um tema que crescentemente vai se tornando dominante no debate sobre o futuro do desenvolvimento afeito a esfera da produção;

Como diagnosticado ainda no século XIX por Karl Marx, o capitalismo parece acelerar cada vez mais a expansão das forças produtivas, e vai encurtando os intervalos entre suas grandes inflexões que são as revoluções industriais.

A primeira revolução industrial, ainda no século XIX com o aparecimento da máquina a vapor, viu transcorrer várias décadas para a eclosão da segunda, com o advento da eletricidade e de linhas de produção mais estruturadas.

Já entre a terceira revolução industrial – fase da eletrônica e da robótica –, observou curto intervalo de poucas décadas até a eclosão da atual quarta revolução industrial, que se impõe poucas décadas depois da que a precedeu, combinando fatores como a digitalização da produção, a internet “das coisas” (dos objetos), a “big data”, a biotecnologia, a nanotecnologia e os novos materiais.

As aceleradas transformações na base produtiva apresentam questões de fundo para a classe trabalhadora, tais como,

(a) alterações no próprio perfil da classe operária, que passa a necessitar de maior nível de escolarização e renda relativamente mais elevada, com efeitos sobre sua própria identidade e sentimento de pertencimento à classe;

(b) efeitos extraordinários sobre a produtividade do trabalho, derivando numa expressa diminuição quantitativa do proletariado industrial e sua sofisticação.

Mais que nunca se imporá, na fase atual de desenvolvimento do capitalismo, o princípio marxista a respeito da dinâmica deste sistema segundo o qual as relações de produção são condicionadas pelo desenvolvimento das forças produtivas; noutras palavras, as possibilidade de aprimorar a qualidade do trabalho social, gerando excedentes, com mais tempo livre para outras atividades humanas nobres, como o estudo ou o convívio social – que passam a ser permitidas pelo desenvolvimento acelerado das forças produtivas – serão travadas pela lógica intrínseca ao capitalismo.

Hoje, como ontem, não cabe atitudes voluntaristas como fizeram os ludistas na Inglaterra por ocasião da eclosão da primeira revolução industrial.

O inimigo dos trabalhadores jamais será a máquina ou a tecnologia; ao contrário, a evolução da forças produtivas, tendencialmente permitirá aumento do tempo livre e maior qualidade de vida, se realizada sobre novas relações de produção.

Para os trabalhadores, a evolução do capitalismo, fortalece, como necessidade civilizatória, sua superação a sistema social superior, o socialismo.

O fato é que a chamada quarta revolução industrial vai se impondo como estratégia de desenvolvimento fundamental em grandes países. A indústria segue sendo fator por excelência para o desenvolvimento.

Os Estados Unidos levaram adiante no período Obama a política de manufatura avançada, como forma de recomposição industrial do país e agora, com Trump, fala-se em “renascimento da manufatura”. A Alemanha, coração industrial da Europa, desenvolve iniciativa denominada indústria 4.0. A China, no contexto de ajustes em seu modelo de desenvolvimento, lançou a iniciativa Made in China 2025, buscando acelerar o desenvolvimento de cadeias produtivas de maior dinamismo em inovação.

Ou seja, a Industria, continua sendo vetor constitutivo da estratégia de desenvolvimento das principais economias mundiais, a começar das três maiores: Estados Unidos, China e Alemanha. Os principais programas em curso, assim, referem-se ao que se convencionou chamar, como dissemos, de quarta revolução industrial.

Apresentando distintos nomes – digitalização e indústria 4.0 na Alemanha, manufatura avançada nos Estados Unidos ou na China -, representam a integração de sistemas ciber-fisícos, com alto nível de robotização e automação, resultando em nova revolução na produtividade[7] – como aliás, foram características das “revoluções industriais” que precederam o movimento atual.

3) A recente desindustrialização brasileira e a experiências recentes de Política Industrial.

Nos últimos doze anos, o país observou a apresentação de três versões de política industrial: a Política Industrial e de Comércio Exterior (PITCE), de 2004, a Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP), de 2008, e o Plano Brasil Maior, de 2011.

Estas iniciativas de política industrial tiveram grande mérito, impedindo um retrocesso mais precoce e agudo, sobretudo tendo em vista o apagão neoliberal dos anos 1990 e início do 2000, na qual inclusive se teorizava sobre a inconveniência da indústria como vetor central da riqueza nacional – a exemplo do que faziam os fazendeiros na República Velha, antes de movimento industrialista iniciado com a revolução de 1930.

Mas as tentativas de política industrial dos últimos três períodos de governo colidiram frontalmente com a macroeconomia.

O fato é que a regressão industrial, nos últimos 20 anos, está diretamente ligada ao pacto nacional vigente desde 1994: a partir do Plano Real – vai-se duas décadas –, define-se que o centro da política econômica é a manutenção da estabilidade de preços, mesmo que a custa do crescimento e da indústria.

A combinação de câmbio sobrevalorizado e as taxas de juros “mais altas do mundo” conferiram nas últimas duas décadas, uma política econômica anti-indústria, neutralizando – essencialmente –, as positivas iniciativas de política industrial. Incrivelmente, somos um país que tem meta de inflação e meta de superávit, mas não meta de crescimento ou de capacidade industrial.

A presidente Dilma buscou enfrentar estas questões: no primeiro mandato, derrubou as taxas de juros a patamares civilizados (atingindo 7,25% a.a., com juros reais de cerca de 2% em outubro de 2012). Nesse caso, entretanto, a reação de setores vinculados ao rentismo e ao capital financeiro internacional foi tão forte que forçou sua reversão. 

Podemos dizer que o trauma inflacionário dos anos 1980 e do início dos anos 1990, parecem ter feito a sociedade aceitar uma lógica perversa: em nome da estabilidade de preços, aceita-se um arcabouço macroeconômico que leva à desindustrialização.

Não é aceitável uma sociedade conviver com taxas de juros mais altas do mundo durante décadas. É sinal de patologia econômica grave e de captura por interesses rentistas espúrios.

Como diz Oreiro (2015), “a taxa Selic representa a taxa de retorno da aplicação financeira livre de risco no Brasil”. Se tivermos uma taxa real de na casa de 4 a 5%, resulta que “em poucos lugares do mundo uma aplicação livre de risco gera uma taxa de retorno tão alta”. Com isso, “os empresários só estarão dispostos a realizar aqueles projetos de investimentos cuja taxa de retorno supere a taxa de juros livre de risco por uma elevada margem (essa margem é o que se conhece como prêmio de risco)”. Lacerda e Loures (2015), observam que, no caso brasileiro, os títulos da dívida pública oferecem “liquidez imediata, razoável nível de segurança e elevada rentabilidade”.

Em síntese, não há investimento legal, de maior rentabilidade que a dívida pública brasileira.

As elevadas taxas de juros brasileira na crise atual, aliás, tem aprofundado tal fenômeno. Como se viu em recente estudo encomendando por um jornal (Folha de S.Paulo, 2 de julho de 2017, p.A18), “os números mostram que o setor privado está poupando como nunca, mas a maior parte dos recursos tem servido para financiar o governo em vez de investimentos produtivos”.

Afinal, “os juros pagos para financiar a dívida pública garantem retorno superior às possibilidades oferecidas às empresas por outras opções de investimentos (…) dos recursos totais captados pelo sistema bancário, nada menos que 72% são destinados exclusivamente ao financiamento do setor público”. A anomalia é tal, que vozes dissonantes começam a aparecer inclusive no seio da corrente monetarista[8].

Mas a questão está longe de ser simples. Amplos e poderosos estratos altos e médio da sociedade brasileira se revelam viciados nessa lógica de auferir o fundamental de seus ganhos pela renda financeira. Não por acaso, trabalhos importantes de balanço dos motivos que levaram ao impeachment de Dilma Rousseff, diagnosticam que o impulso inicial veio ao cutucar onça com varas curtas[9].

Cabe identificar aqui um outra questão curiosa, como argumentou recentemente um analista estrangeiro: “a direita do Brasil gosta de se queixar dos impostos, mas não parece ter problemas com o maior e mais economicamente destrutivo deles: os juros exorbitantes que os brasileiros pagam sobre sua dívida pública”. Lembra o analista que em 2016, cerca de 7,6% do PIB foi gasto com o pagamento de juros sobre a dívida. Assim, “trata-se, de um total de 183 país, da quarta mais alta carga de juros sobre a dívida pública”, similar a um país em guerra civil (Iêmen)[10].

Em outras palavras: com uma mão paga-se “x” em impostos e com outra se recebe “x-plus” em dividendos das aplicações em juros.

O custo fiscal disto é dramático. Para se ter uma ideia, apenas os modestos cortes de 4 p.p. nas taxas de juros no último ano, reduzindo-a de 14,25% para 10,25%, representam uma redução de R$ 100 bilhões em relação aos gastos com a dívida pública em 2015[11], já que as “despesa da União com o pagamento de juros da dívida deve chegar a R$ 402,2 bilhões, quase R$ 100 bilhões a menos do que em 2015”.

Algo parecido ocorre em relação a taxa de câmbio, cujo patamar é determinante para abrir ou fechar portas às exportações manufatureiras. Muitos analistas tem denominado a prática de manter a moeda estruturalmente sobrevalorizada, em especial desde o Plano Real, de populismo cambial, uma vez que resultaria, especialmente na classe média, numa falsa sensação de poder de compra, que a permite comprar qualquer tipo de bugigangas de Miami.

Excetuando-se um breve período com Dilma, no qual se buscou por meio de custosos mecanismo de swap cambial manter a moeda competitiva, há quase 25 anos convivemos com moeda sobrevalorizada, que junto com juros altos, formam duo mortal à indústria nacional. No período Lula, por exemplo, “a preços de hoje, a taxa de câmbio entre dezembro de 2002 e dezembro de 2010 apreciou-se de R$ 5,10 por dólar para R$ 1,90 por dólar” (Bresser Pereira, 2015). Em grande medida, tal apreciação cambial foi fator determinante para um modelo de crescimento ancorado na demanda (consumo).

Com uma política macroeconômica hostil à indústria, não restou às meritórias política industrial e de inovação dos governos Lula e Dilma se não, o papel de enxugar gelo.

Com Temer, contudo, a situação se torna muito mais dramática, pois além de se manter os dois preços macroeconômicos (juros e câmbio) na mesma anomalia descrita, se interrompe as medidas mitigadoras que existiram nos últimos 13 anos. Dentre elas:

a) a persistente retirada, sem qualquer critério logico que não o de planilha, de subsídios, desonerações, incentivos e regimes especiais, inclusive de exportações, à indústria;

b) o empoçamento de recursos de crédito no BNDES, com encarecimento dos custos (Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) substituída por taxa de mercado, chamada Taxa de Longo Prazo (TLP)), aperto nas exigências para concedê-los e devolução antecipada de R$ 100 bilhões ao Tesouro, numa espécie de “pedalada fiscal” ao contrário.

c) Desmantelamento da Política de Conteúdo Local (PCL), seja como critério para a concessão de empréstimos a taxas mais favoráveis no BNDES, seja na sua revisão no setor de petróleo e gás (P&G). Em P&G, a revisão da PCL foi tão radical, que setores da indústria advertem que poderá se preencher as novas regras sem comprar “um parafuso” da indústria nacional – novamente, uma “quebra de contrato”, já que os leilões exigiam o cumprimento da PCL. 

4) Conjuntura industrial: onde estamos hoje?

Os números mais recentes da conjuntura industrial, no momento em que preparamos esta nota, apontam:

– Que em 2016, foram fechadas 321.503 vagas na indústria de transformação (O Globo, 19/6);

– Elevadíssimos níveis de ociosidade na indústria. Segundo os Indicadores Industriais da Confederação Nacional da Indústria (CNI), o último dado disponível apontam redução no uso da capacidade instalada, que decaiu de 77,1% para 76,5%, de abril para maio (OESP, 02/06). Portanto, quase ¼ da capacidade industrial está ociosa;

– Ao mesmo tempo, os números do IBGE referente ao 1º trimestre de 2017, indicam queda na taxa de investimentos para 15,6% do PIB, contra 16,8% há um ano atrás, pior patamar registrado em um primeiro trimestre na série histórica do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), iniciada em 1996, portanto, o menor patamar em 21 anos. O investimento está em queda há 12 trimestres consecutivos. A queda foi de 3,7%, comparado ao primeiro trimestre de 2016, e de 1,6% em relação ao quarto trimestre do ano passado;

– Indutor do investimento privado, o Investimento público federal é o menor desde 2009 (OESP, 07/05). A partir de 2018, tal margem se estreitará enormemente, dada a “camisa de força” autoimposta pelo Estado brasileiro a partir da promulgação da emenda constitucional prevendo um teto de gastos não-financeiros. No momento atual, o volume de pagamentos feito pelo governo entre janeiro e abril deste ano de 2017 ficou 57% abaixo do verificado em igual período do ano passado, ou seja, às vésperas do afastamento de Dilma. Entre janeiro e abril, o volume de pagamentos feitos pela União caiu para menos da metade em relação a igual período de 2016, de R$ 19,1 bilhões para R$ 8,1 bilhões. Outro estudo (FSP, 02/07), mostra que a taxa de investimento do setor público caiu a 1,8% do PIB em 2016, o menor nível desde 2004 – ano em que o Brasil estava em severo ajuste fiscal no início do governo Lula; 

– Já o “Investimento privado recua ao menor nível desde 2000” (FSP, 02/07, p.A18). Após registrar os maiores índices de investimentos, neste século, de 19% do PIB nos anos de 2008 e 2013, o investimento privado (empresas e famílias) alcançou, em 2016, 13,7% do PIB, segundo estimativas do Cemac. Ao mesmo tempo, “Os números mostram que o setor privado está poupando como nunca, mas a maior parte dos recursos tem servido para financiar o governo em vez de investimentos produtivos”. Afinal, “os juros pagos para financiar a dívida pública garantem retorno superior às possibilidades oferecidas às empresas por outras opções de investimentos (…) dos recursos totais captados pelo sistema bancário, nada menos que 72% são destinados exclusivamente ao financiamento do setor público”. O autor do estudo estima que um crescimento na casa de 3% a 4% do PIB exigiria uma taxa de investimentos na casa de 20% do PIB;

Conclusão parcial

Com elevada capacidade ociosa, devido a insuficiência de demanda devido ao alto desemprego, endividamento e falta de crédito, e com retorno de investimento em títulos públicos superior ao investimento produtivo, as empresas não investem. Assim, não há, no curto prazo, reversão da situação econômica.

Voltemos aos números:

– A indústria de transformação, especificamente, caiu 1% no último trimestre em relação ao período de janeiro a abril do ano passado, oscilando 0,9% em relação ao trimestre anterior (IBGE);

– Nos cinco primeiros meses de 2017, comparado ao mesmo período de 2016, a queda nas vendas da indústria foi de 5,7%, segundo a CNI (OESP, 04/07);

– A deterioração no emprego manteve a queda no Consumo das Famílias (-0,1%), pelo nono trimestre consecutivo, que recuou 1,9% no primeiro trimestre ante o mesmo período de 2016, também o nono resultado negativo consecutivo;

– O resultado de 1% de crescimento no primeiro trimestre em relação ao trimestre anterior, foi puxado basicamente pela agropecuária, que teve um salto de 13,4% no período, e pela indústria extrativa, que subiu 9,7%; o pujante setor agrícola, “salvando a lavoura” obteve uma safra recorde, resultado do fim das adversidades climáticas que marcaram 2016. Para diversos economistas, só os próximos trimestres dirão se a recessão chegou ao fim, no que parece ser pouco provável olhando os números acima. Na comparação com o mesmo trimestre de 2016, o PIB encolheu pelo 12.º trimestre seguido: -0,4%;

– a pequena oscilação em relação ao último trimestre de 2016, mais que revelar qualquer recuperação, mostra a economia mais que nunca dependente do setor primário e da indústria extrativista (basicamente minérios e petróleo) e é produto direto da perda de importância relativa da Indústria de Transformação. Na contramão dos demais segmentos, o setor agrícola avançou 15,4% em relação a igual período de 2016 e 13,4%, comparado aos últimos três meses do ano passado. “Infelizmente, voltamos a nos comportar como um país exportador de commodities. E não existe desenvolvimento nesses moldes”, afirmou o economista da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP) Nelson Marconi;

– Segundo o último número do IBGE divulgado no final de abril, a taxa de desemprego está em 13,7%, atingindo 14, 2 milhões de pessoas, contra 10,9% de um ano antes. Segundo Indicador Serasa, o número de consumidores inadimplentes no Brasil atingiu 61 milhões em maio deste ano, o maior número da série histórica desde 2012;

– Por fim, o IBGE acaba de divulgar na última terça-feira, dia 04/07, os números do monitoramento mensal da produção industrial brasileira. Ante número ligeiramente positivo pelo 2º mês consecutivo (0,8% em maio, depois de 1,1% em abril, sempre em comparação com o mês anterior), novamente, a equipe econômica de Michel Temer comemorou. Infelizmente para o país, todavia não há o que comemorar.

Em grande medida, o número levemente positivo é puxado pelo aumento de dos segmentos: bens de capitais e venda de veículos; abrindo os números, no entanto, se vê que a venda de máquinas se deu principalmente no setor agrícola; já a venda de veículo deveu principalmente pelas exportações, no que pode inclusive ser considerado como decisões intra-compania.

A alta, contudo, se dá sobre base extremamente deprimida. Afinal, segundo o próprio IBGE, o nível de produção industrial hoje, ainda se encontra no nível de fevereiro de 2009.

No acumulado em 12 meses (maio de 2017 a maio de 2016 – período em que Temer está no governo), todavia registra-se queda produção industrial de 2,4%

Dados parciais que vêm sendo divulgados, como alta capacidade ocioso, apontam, segundo economista ouvido pela Folha de S. Paulo (Edição de 05 de julho de 2017), em queda de 0,7% em julho na produção industrial, o que fará que o 2º trimestre do PIB industrial permaneça estagnado ou mesmo levemente negativo – neste caso será pelo 13º trimestre consecutivo.

O cenário é dramático. Podemos sintetizar as dramáticas condições macroeconômica atuais – amplamente hostil à produção e ao trabalho – a partir dos seguintes fatos da conjuntura: 

– o Real segue elevado (apreciado);

– o crédito continua restrito – a despeito da positiva troca recente de comando no BNDES, está em curso enorme pressão por parte do “mercado” para que seus recursos empoçados sejam canalizados para pagamento ao Tesouro Nacional e não liberado às empresas na forma de crédito;

– as empresas seguem altamente endividadas e as primeiras, com elevado número de máquinas paradas – a ociosidade industrial continua elevada, como se viu acima;

– a demanda interna continua fraca – como se viu acima, por fatores relacionados ao desemprego e a crescente inadimplência (endividamento das famílias);

– chegou-se ao fim do efeito pontual da liberação das contas inativas do FGTS;

Agregaríamos ao anterior o fato de que os efeitos nefastos da Operação Lava Jato sobre a economia seguirão no horizonte, como no fato desta ter deixado mais de R$ 90 bilhões em obras paradas (OESP, p. B3, 18/06).

Superar esta atual estado de coisas é a grande questão que se impõem ao Brasil e aos brasileiros.

5) Por uma estratégia de re-industrialização nacional.

Falemos agora do futuro. Busquemos delinear opções – uma plataforma – voltada a reverter a dramática situação acima exposta, e retomar o caminho do desenvolvimento ancorado na indústria.

No curso da definição de um novo projeto nacional de desenvolvimento, cabe robusta política industrial e de inovação – uma estratégia nacional de reindustrialização –, que abra um novo período de expansão, recompondo as bases do projeto nacional.

Como se faz nas experiências mais avançadas em curso no mundo, deve-se integrar política industrial e política de inovação, estimulando, a criação de novas competências em áreas de maior dinamismo potencial da economia mundial.

Para isso, se deverá enfrentar um leque de desafios: 

(i) desenvolver fatores de competitividade sistêmica em linha com as condições internacionais, de modo que a indústria nacional possua condições isonômicas de competição, tanto no mercado interno – onde concorre com importações – quanto no mercado externo – para a promoção de exportações;

(ii) quanto a dimensão horizontal e sistêmica da política industrial e de inovação, efetivar uma política macroeconômica pró indústria, baseada em condições macroeconômicas favoráveis à reindustrialização, o que pressupõe não apenas um ambiente estável, mas políticas favoráveis aos investimentos, tais como:

– taxas de juros compatível com os padrões internacionais, tendo em vista o porte de nossa economia, inexistência de histórico de insolvência, etc.;

– política cambial que situe a moeda em patamar adequado às exportações industriais. Não cabe utilizar o câmbio como instrumento de combate a inflação, como se fez, erroneamente, na maior parte das últimas duas décadas e se sinaliza, com a nova meta de inflação, no próximo período;

– recomposição do sistema de crédito e financiamento público – a partir do BNDES, Finep e bancos públicos –, e privado – através do fomento ao mercado de capitais. Num contexto de aproximação da taxa de juros (Selic) ao padrão internacional, de fato, a taxa subsidiada (atual TJLP) poderá dar ênfase à inovação, onde – mostra a experiência internacional – sem o apoio e liderança do Estado, não ocorre desenvolvimento de novas capacidades[12];

(iii) ainda quanto a dimensão horizontal da política industrial e de inovação, buscar enfrentar questões de aumento da produtividade sistêmica, através, dentre outras, de medidas como:

– um vigoroso programa de infraestrutura de integração nacional. O tema da integração nacional é essencial para enfrentarmos um passivo que todavia, em pleno século XXI, se arrasta desde os primeiros planos de integração do território no século XIX. Ainda hoje, não temos o conjunto do território nacional integrado e articulado;

– fomento a educação, destacando-se, para isso, a importância da continuidade da expansão da rede pública de ensino superior, tecnológica e profissionalizante, tendo em vista os impactos das modernizações tecnológicas no trabalho do século XXI;

(iv) quanto à dimensão vertical da política industrial:

– adoção do conceito de políticas de aglomeração (clusters) combinado com programas mobilizadores e de mission-oriented que busque, em esforço coordenado entre empresas públicas e privadas, universidade e Estado, incluindo seu poder de compra, que realizem ações articuladoras e otimizadoras de ecossistemas de inovação; estes devem ser necessariamente temáticos e focados no desenvolvimento de tecnologias críticas especificas e na resolução de problemas técnicos específicos que permitam criação de novas competências industriais e tecnológicas.

– nesse mesmo sentido anterior, definir o uso, no contexto das definições de política industrial e de inovação, do instrumento de poder de compra do Estado (procurement) visando induzir inovação em áreas de fronteira e de reconhecida expertisse nacional, como saúde, agricultura, energia, Defesa nacional, dentre outras.

– retomar políticas de conteúdo local competitivas, que estimulem a criação de segmentos em áreas dinâmicas da economia nacional, com aferição de resultados, contrapartidas e prazos de validade;

– nesse sentido, cabe ao país estimular a política de criação de campeões nacionais – atualmente demonizada pela ideologia neoliberal, que aproveitando equívocos cometidos no passado, busca eliminar essa necessidade que todos os grandes Estados nacionais estimulam, 

(v) quanto a base produtivas constituída no primeiro esforço de industrialização nacional, é preciso medidas para a recuperação de capacidades e elos perdidos no recente esvaziamento de cadeias produtivas; concomitantemente a isso, um aspecto destacado de uma nova política industrial e de inovação, deverá observar a importância de modernização do parque produtivo instalado, fruto das segunda e terceira revolução industrial – parte delas, todavia não internalizadas. Assim, será preciso forte apoio a inovação incremental, que poderá gerar um salto de produtividade na indústria tradicional por meio do progresso tecnológico advindo da incorporação de novas máquinas e equipamento[13].

(vi) Instituir fortes mecanismos de governança e avaliação da política industrial e de inovação, visando aferir resultados, monitorar desempenhos, propor ajustes ou descontinuidades ou mudanças de rotas e analisar a efetividade de subsídios, incentivos e outros mecanismos de apoio público. Hoje, o Estado brasileiro carece dramaticamente destas competências, cometendo erros derivados dessa insuficiência, que acabam por reforçar argumentos ideológicos liberais. Mesmo ilhas de excelência do Estado brasileiro, como BNDES e Finep, carecem de mecanismos internos de aferição da efetividade de suas políticas.

(vii) no que diz respeito

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