Mais de 80% dos candidatos autodeclarados evangélicos são filiados a partidos mais à direita
Michelli Possmozer *
A identidade religiosa desses candidatos foi identificada a partir de um filtro com o uso das palavras “pastor”, “pastora”, “missionário”, “missionária”, “bispo”, “bispa”, “irmã”, “irmão”, “reverendo”, “reverenda”, “capelão” e “sacerdote”. Na maioria dos casos, esses vocábulos estão registrados no próprio nome de urna ou no campo em que está indicada a profissão do candidato.
Quando se trata de evangélicos, não podemos tratá-los como homogêneos, tendo em vista a diversidade de denominações e as especificidades de suas doutrinas e posicionamento diante das questões políticas. Seria necessário um estudo mais aprofundado acerca das igrejas as quais cada um desses candidatos é membro a fim de entendermos de quais evangélicos estamos falando. Isso é importante até para identificar se sua participação política se dá enquanto sujeito coletivo – que representa, portanto, o pensamento da igreja – ou como sujeito individual, que embora esteja ligado a uma denominação religiosa, sua incursão na cena política pode não refletir o direcionamento de determinada igreja.
É preciso ter cuidado quando nos referimos a um “projeto de poder dos evangélicos”. Existe, sim, um projeto de poder político-religioso em curso, que vem sendo orquestrado por lideranças evangélicas por meio de uma aliança com grupos de direita e extrema-direita. Esses sujeitos utilizam a religião como instrumento com o intuito de ocupar cada vez mais os espaços do legislativo, do executivo e do judiciário para conquistar seus interesses, que são de ordem corporativa e econômica. Mas isso não quer dizer que tal projeto é de todos os evangélicos.
Quando se apresentam os irmãos que aqui estão, colocando os seus nomes para um projeto de país, Deus está dizendo: “essas pessoas eu vou poder usar”. Mas nós estamos em tempo de Guerra! E em tempo de guerra nós temos lado! Tempo de guerra não é tempo de abraçar inimigo! É tempo de vencer o inimigo! Eu não consigo entender — e é bom a diversidade de pensamentos — […] Mas eu não consigo conceber, entender, onde nós temos pastores de esquerda! A esquerda serve ao inimigo! A esquerda é contra todos os valores que nós defendemos!
Para entendermos em que consiste o “projeto de país”, mencionado pelo desembargador, precisamos olhar o que está para além do discurso e das igrejas. Não se trata de um projeto só religioso, mas também não é só político. Existe um entrelaçamento entre os dois campos e interesses econômicos envolvidos. E no meio de todo esse cenário está a disputa pelo voto do segmento religioso que mais cresce no país e que, segundo projeções, pode ultrapassar o número de brasileiros católicos nos próximos anos.
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* Michelli Possmozer é doutora em Sociologia Política, Mestra em Ciências Sociais e graduada em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo. Possui experiência como repórter de jornal impresso, comunicação institucional e pesquisas nas áreas de Religião e Política, Sociologia Urbana, Sociologia da Violência, Desenvolvimento Urbano e Políticas Públicas.
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